segunda-feira, 24 de julho de 2017

A LUTA DE CLASSES .

Quem é que disse 
que não havia luta de classes .

Dos sítios por onde andei, nunca senti a violência calada da
luta de classes, como no Tortosendo e na Covilhã, meios fa-
bris dos lanifícios .
Confesso que também nunca foi tão rude o ódio e o asco às
classes possidentes, cujas famílias exibiam vários automó-
veis por família, e um desprezo total pelos trabalhadores . 

Houve uma época, muito curta, por sinal, a era dos Cursilhos
da Cristandade, em que todos eram irmãos em Cristo, e se tra-
tavam todos por tu, operários e patrões, as cenas ridículas a 
que eu assisti, nessa altura .

Tudo acabou, em menos de um fósforo .

O café mais importante da Covilhã era o Café Montalto, ponto 
de encontro das classes sociais mais consideradas, onde não en
travam o eram operários e estudantes .

A segregação era de tal monta, que as mesas estavam marcadas,
de acordo com as profissões - havia a mesa dos industriais, dos dou-
tores, dos professores, dos bancários, e por aí adiante .

De vez em quando, saíamos em bando do Colégio, e vínhamos pou-
sar, um ou dois por cada mesa, antes da hora do almoço .
Pedíamos uma bica e ninguém para aviar, e assim ficávamos a fazer
fincapé, até nos serviam a contragosto, pois que se aproximava a 
hora de suas excelências .

Havia outras malandrices que praticávamos, tínhamos ritos e cos-
tumes que levávamos à séria .

Por exemplo, era obrigatório fintar os polícias, e atravessar as ruas
fora das passadeiras .

Vem este paleio a propósito da Escola da Noite, em que no primeiro
se criaram dois grupos distintos, 
de um lado, os filhos dos industriais, o Saraiva, o Carrilho, o Lobo, 
o Gíria e o Proença . 
Do outro, os verdadeiros trabalhadores-estudantes, oriundos das clas-
ses com menos posses - o Paixão, o Cunha, o Raúl Peixeiro e eu, que 
era estudante-estudante .

E assim coabitamos durante todo o curso de Debuxador .
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